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Norton Demaria Boiteux

 

 

CATOLICISMO, POSITIVISMO

e

SOCIALISMO

 

 

Conferência comemorativa do Centenário da morte de Augusto Comte, realizada no Instituto Brasileiro de Filosofia, em Florianópolis, Santa Catarina, no dia 20 de dezembro de 1957.

Antes de passar ao objeto desta reunião desejo agradecer a todos que generosamente permitiram fosse realizada nesta Casa a presente comemoração.

Ao Sr. Professor George Agostinho da Silva um abraço especial de gratidão.

 

O centenário da morte de Augusto Comte vem sendo dignamente comemorado em muitos pontos da Terra, principalmente na França, seu país natal, e no Brasil, onde sua doutrina obteve maior repercussão.

Na palestra que ora iniciamos temos apenas o propósito de prestar uma pálida homenagem ao gênio de Montpellier.

Parecerá muito pretensioso o tema que escolhemos: "Catolicismo, Positivismo, Socialismo". Devemos, porém, desde logo ponderar que nos falta tempo e, sobretudo, competência para fazer uma análise sistemática e completa desses três grandes assuntos.

Nosso intuito é bem mais modesto: caracterizar em termos gerais a extraordinária missão moralizadora do Catolicismo e o atual surto irreprimível do Socialismo e concluir que, de fato, o sistema de Augusto Comte, o Positivismo, concilia, harmoniza, acomoda o idealismo católico com o materialismo socialista.

A vida e a obra do filósofo têm sido apreciadas sob múltiplas facetas. Em todas elas ressalta a grandeza moral e mental do homem que ousou conceber um sistema religioso cujo culto é endereçado aos benfeitores da espécie, consubstanciados na própria Humanidade, cujo dogma é a ciência em um regimen pacifico-industrial.

 

Pedimos aos prezados amigos que nos ouvem não emprestarem às nossas palavras nenhum tom crítico ou acrimonioso.

Temos sempre presente a advertência de Rosalia Boyer, mãe de Augusto Comte:

"Meu filho não ataques a religião católica".

E o filósofo, com a ternura filial que nunca o abandonou, em seus mais severos julgamentos filosóficos, jamais derramou uma só gota de fel sobre a crença dos seus pais.

Aliás, a atitude de Augusto Comte em relação a todas as doutrinas que, no tempo e no espaço, esforçaram-se por resolver o eterno problema humano, foi sempre de grande apreço e relatividade.

Em verdade, para todos aqueles que sentem as angústias do drama universal de que somos, ao mesmo tempo, espectadores e participantes, para aqueles que acreditam na vitória final do belo, do verdadeiro e do bom, só uma conduta é aconselhável: a união, em torno dos supremos interesses da

Família, da Pátria e da Humanidade.

É impossível negar que a espécie humana atingiu agora um estado verdadeiramente crítico.

Lavram em toda parte o descontentamento, a insegurança e a intranqüilidade.

A grande massa proletária, que durante milênios vegetou miseravelmente à margem da sociedade, está exigindo, em altos brados, um lugar ao sol.

Os chefes industriais sentem-se ameaçados em seus bens, de que se habituaram a se considerar senhores absolutos.

Os governos políticos, incapazes de manterem a ordem material no meio da desordem espiritual, adotam medidas de compressão que levam ao desespero e à revolta.

Teoristas de todos os matizes, alarmados com o quadro angustioso que se depara, improvisam, com os destroços dos sistemas decaídos, paliativos destinados a conter a anarquia. Mas a realidade pungente destrói suas efêmeras esperanças.

Finalmente as Mulheres - sacerdotisas do lar e da moral - obedientes à voz do coração, apegam-se sofregamente a doutrinas exaustas que apenas lhes prometem para depois da morte uma compensação pelas agruras da vida.

Não há mais saúde, nem felicidade.

A religião católica - essa construção admirável - conseguiu, no passado, imprimir às populações ocidentais um impulso gigantesco, sobretudo moral. Graças a ela foi obtida a emancipação da Mulher e a libertação dos trabalhadores. E uma grande paz envolveu o Ocidente.

Como explicar que, depois de ter, durante séculos, presidido incontestavelmente ao surto da vanguarda da população humana, tenha declinado gradualmente o prestígio do Catolicismo, ao passo que se observa, principalmente neste meio século que passou, um progresso incoercível do Socialismo?

É o que tentaremos explicar em poucas palavras.

Recuando rapidamente na história verificamos que a Grécia antiga foi a sede da elaboração intelectual que - sob o tríplice aspecto, estético, filosófico e científico - inaugurou a marcha para o pensamento moderno.

Já a organização social-militar romana, após ter estendido seu domínio e sua disciplina, imprimindo no mundo europeu o conceito de ordem e trabalho, espalha pelo seu vasto império todos os magníficos frutos espirituais peculiares ao berço helênico.

A missão intelectual da Grécia, ao passo que lhe proporcionou eterna glória, exigiu-lhe um sacrifício total. Porque a inteligência, entregue a si mesma, pouca eficácia tem sobre a conduta; E a civilização grega só foi salva pela conquista romana.

O destino de Roma, porém, sendo social, politico-militar, determinou no povo romano uma atitude moral digna e elevada. Cessado porém o estimulo provisório que a expansão do império suscitou, resultaria uma crise gravíssima que abalaria pelos alicerces aquele grandioso edifício tão penosamente construído. E Roma se desmoronou.

Provado estava que a inteligência, com toda a sua presunção, era incapaz de se governar sozinha. Provado estava também que a ação, mesmo ajudada pela reflexão, não tem a necessária estabilidade para se manter.

Surge, então, o elemento novo; o cimento robusto, o influxo vivificador, suscetível de unir. disciplinar e sublimar a inteligência e a atividade. Vai ser finalmente empregado o mais poderoso instrumento de moralização dos costumes e de união entre os homens.

Desponta a era do sentimento. Nasce o Catolicismo.

"Se eu falar as línguas dos homens e dos anjos" - dizia o incomparável São Paulo - "e não tiver amor, sou como o metal que soa ou como o címbalo que tine.

E se eu tiver o dom da profecia, e conhecer todos os mistérios, e quanto se pode saber, e se tiver toda a fé, até o ponto de transportar montanhas, e não tiver amor não sou nada.

E se eu distribuir todos os meus bens no sustento dos pobres, e se entregar o meu corpo para ser queimado, se todavia não tiver amor, nada disso me aproveita.

O amor jamais há de acabar, ou deixem de ter lugar as profecias, ou cessem as línguas, ou seja abolida a ciência.

Agora,- pois, permanecem a fé, a esperança e amor, porém a maior delas é o amor".

 

O Catolicismo nutria duas grandes aspirações, tornar-se universal e definitivo.

Estes dois ideais constituem, na opinião de Augusto Comte, seu maior-mérito e a sua melhor crítica. Mérito pelo vasto propósito, crítica pelo malogro final.

Realmente a tendência para uma doutrina que pudesse abranger o mundo conhecido era bastante sensível. Por outro lado, todas as almas bem formadas sentiam a urgência de algum meio regenerador do coração humano.

Mas a civilização greco-romana, além dessa inclinação para o universalismo, já vinha bastante impregnada do espírito positivo e do élan industrial. Resultou daí a resistência que as elites intelectuais e os chefes práticos do Ocidente antigo opuseram ao advento do Catolicismo que, embora dando largas ao sentimento, menosprezava a inteligência e entorpecia a atividade.

Obrigado a assentar a conduta humana na perspectiva de uma vida futura, ele relegou a um plano subalterno a existência terrena e fez consistir a perfeição no isolamento celeste, onde os mais nobres e delicados laços sociais se desfazem para sempre.

Lembremo-nos das palavras de São Pedro: "Caríssimos, eu voz rogo como a estrangeiros e peregrinos..."

Além disso o Catolicismo ignorou no Ser Humano qualquer inclinação benévola, que só poderia surgir graças ao bafejo sobrenatural.

O trabalho, hoje unanimemente reconhecido como instrumento dignificador da nossa natureza, foi considerado como derivado da maldição divina.

A Mulher, núcleo central da família, que é a célula moral e política da sociedade, era também erigida em instrumento da perdição da espécie.

Em suma, o Catolicismo prepara os homens para a vida celeste, mas não esconde seu desprezo peIa existência terrena.

Mas, como é possível, dirão os estudiosos, que um sistema tão contrário à vida na Terra, tenha perdurado tantos séculos e produzido tão admiráveis frutos?

É que a espécie humana necessitava urgentemente de uma preparação que, com base no pleno desenvolvimento dos pendores morais, ensejasse o grande passo para um regimen definitivo.

Urna, abolir a submissão feminina e a escravidão proletária.

E o Catolicismo, não obstante suas limitações intelectuais e suas inibições práticas, era portador de tais reservas de altruísmo que aquela dupla emancipação social pôde ser concretizada.

Glória, portanto, a essa bendita crença que imprimiu ao Ocidente um tão gigantesco progresso; glória a esses admiráveis santos, modelos de humildade, desprendimento e devoção, que, com suas almas inundadas de amor ao próximo, alcançaram resultados tão sublimes !

Passaremos por alto, visto não interessar diretamente ao nosso estudo, a luta travada pelo Catolicismo, primeiro contra o Islamismo e depois contra as várias facetas da Reforma protestante.

Cumpre-nos deter-nos, todavia, em um fenômeno que, qual branda aragem em seus albores, atingiu modernamente a intensidade de um vendaval perigoso:

o Socialismo de Força.

O Socialismo, em seu início, é uma reação espontânea da massa trabalhadora contra as doutrinas que colocam a felicidade do pobre, só após a morte, nos firmamentos ou páramos celestiais.

O proletário começa pouco a pouco a perceber que trabalha, na miséria e no sacrifício, para uso e gozo de um reduzido grupo de privilegiados.

Esses continuam a apregoar as excelências da vida eterna, mas entregam-se avidamente ao luxo e aos prazeres da existência terrena, muito breve, porém cada vez mais cheia de atrativos e comodidades.

E o pobre é levado a conjeturar, isto é, a supor, sobre a iniquidade, ou sofrimento, que sobre ele pesa, despojado do quinhão que, de justiça, lhe deveria caber durante sua passagem por este mundo.

Surge o primeiro pensamento socialista que podemos assim expressar : obter uma distribuição mais eqüitativa dos bens materiais, cujo acúmulo resulta do trabalho de todos.

Vemos logo que o pensamento Socialista Comunista – é eminentemente revolucionário, pois desvia ó indivíduo de suas preocupações sobrenaturais para as solicitudes puramente humanas. Por outro lado, passa de um plano místico e idealista para um nível utilitário e materialista.

Na verdade o homem começa a perceber que a sede real de sua existência ( embora curta) é a Terra, essa Mãe extremosa que lhe dá morada; abrigo e alimento e que, ao fim de seus dias, recolhe amorosamente os seus despojos.

E a existência terrena vai assumindo uma importância cada vez maior, ao passo que a consideração da vida futura, da vida depois da morte, se atenua progressivamente.

Robustecida a idéia de que a verdadeira existência é aquela que desfrutamos na Terra; procura o homem se organizar nessa base, surgindo então o conceito de sociedade, isto é, de grupos humanos ativos e solidários.

Posteriormente desvendam se os princípios gerais, as normas imutáveis que regem a ordem e o progresso social.

A sociedade e o homem são regidos por leis inflexíveis tão fatais como as da astronomia, da física e da química. Falta-lhes, porém, o grau de precisão peculiar às ciências fundamentais.

É justamente essa imprecisão que a muitos ilude.

Juliano o Apóstata, Napoleão, Hitler, Mussolini ousaram imaginar que poderiam, com suas vontades fortes e com seus desígnios retrógrados, mudar o curso da história, alterar a incoercível evolução social, isto é, que não pode ser coagida.

Pagaram caro o seu engano por desconhecerem que - conforme proclama Augusto Comte –

"O homem se agita, a Humanidade o guia",

adaptação positiva de sentença de Bossuet : "O homem se agita, Deus o conduz".

Atualmente são tão fortes o sentimento e a noção de fatalidade social, que várias doutrinas disputam o privilégio de liderar os povos sob a égide dos imperativos históricos.

Todas, porém, com uma única exceção, encaram o homem, individual ou em grupos, sob critérios parciais ou prismas deformantes.

Todas sentem que a nossa espécie não será feliz enquanto a imensa e sofredora massa proletária continuar à margem da sociedade.

Todas, menos uma, acreditam que o problema é simplesmente material, capaz de ser politicamente resolvido. Desconhecem o quanto "os erros morais são fecundos em desastres materiais".

E, em face da desordem material reinante, guiando-se pelas aparências, preconizam soluções, puramente, no terreno chamado econômico.

A natureza humana é tríplice: moral, intelectual e física. Nela tudo converge, tudo concorre, tudo conspira. Em sua longa caminhada para o futuro, o homem busca incessantemente o bem estar corporal, a realidade positiva, a harmonia, e a serenidade moral.

Vemos logo como são estreitos e falazes, isto é, enganador, os pontos de vista daqueles que subordinam a marcha da sociedade a imperativos só econômicos.

Igualmente falsos são os conceitos dos que esquecem as contingências materiais da espécie e fazem depender os acontecimentos sociais de meras exigências do espírito.

Essa apreciação parcial leva a conclusões apressadas e a tremendos erros.

Ao invés de curarem os males sociais fazendo um saudável tratamento clínico, agem empregando cirurgia grosseira, vale dizer, propondo a ablação de órgãos importantíssimos pelo simples fato de estarem doentes ou funcionando mal.

O Comunismo - por exemplo - porque muitos governos, passados e presentes, foram e são tirânicos e opressores, procura suprimi-los, esquecendo que, de fato, a tirania e a opressão são males terríveis que precisam ser extirpados, mas que o governo, em si, é uma instituição indispensável e inevitável, cuja solidez deve ser desejada por todos.

O capital - instituição vital para o advento, conservação e evolução da Humanidade, é também vítima dos ataques comunistas, por estar sofrendo de uma gravíssima moléstia crônica: o Capitalismo de Estado.

O Capitalismo, isto é, a exploração da sociedade pelo capital, deve desaparecer. O imenso acervo acumulado multimilenarmente pelas gerações passadas destina-se a prover o conforto material da totalidade, isto é, da totalidade dos seres humanos.

Escravizar, física ou economicamente, o proletariado para ampliar o capital em proveito de um grupo de monopolistas privilegiados é crime inominável que brada por castigo severo.

Mas isso não significa que o capital tenha que acabar. Urge, sim, curá-lo dos seus vícios odiosos para que ele possa enfim e per omnia saecula beneficiar a todos que habitam toda a Terra.

Além desses preconceitos revolucionários, que levam à eliminação dos órgãos sociais doentes, cumpre mencionar aquele que consiste em desconhecer a força espiritual e a influência moral, para só considerar o poder temporal, isto é, o governo, como único órgão capaz de resolver os problemas sociais.

Esse falso juízo é comum a todas as doutrinas socialistas ora existentes, nacionais ou internacionais. Erro gravíssimo.

Como dissemos, o homem é um ser tríplice. A natureza humana é, ao mesmo tempo, afetiva, especulativa e ativa.

Cabe ao poder temporal, ao poder prático, isto é, ao governo, presidir a atividade material.

Entretanto, querer penetrar na consciência, no foro íntimo das cidadãos, é supremo despotismo.

As ações, propriamente ditas, de cada um, têm que ser reguladas de modo a evitar os choques e assim assegurar a ordem. Eis o papel dos Governos Temporais.

Mas a política ocidental moderna repele qualquer medida tendente a ferir, de leve que seja, o princípio fundamental da dignidade humana que é a liberdade espiritual.

O governo regula os atos, a autoridade espiritual esclarece e orienta a inteligência; a influência moral, cuja sacerdotisa é a Mulher, que eleva e disciplina o sentimento, para o lado altruísta

.

Ao passo que a ação governamental é eminentemente coercitiva, só a convicção pode dobrar as inteligências, só a persuasão impulsiona o sentimento.

Por sutis que pareçam os influxos espirituais afetivos, eles possuem uma força só desconhecida pelas naturezas humanas mesquinhas e vulgares.

A hipertrofia do poder temporal conduz a onipotência do Estado, levado assim a exorbitar de suas funções, intervindo na esfera espiritual onde a sua intromissão é sempre abusiva. Então começam a supressão das liberdades e a reclusão do cidadão a um simples dente da rígida engrenagem administrativa.

Retornando, depois de longa digressão, ao assunto em pauta, podemos afirmar que o Socialismo não Pacifista, implica no reconhecimento de que os indivíduos fazem parte integrante de um grupamento, devendo ser as partes evidentemente subordinadas ao todo.

O ponto de vista social é verdadeiro. Mas os socialistas, contaminados de prejuízos revolucionários, acreditam que seja possível regenerar e reorganizar a sociedade por processos políticos e artifícios econômicos.

Ignoram o conceito de Augusto Comte: "Não há remédios políticos para males morais". É que somente pela Educação dos Sentimentos, maximizando o altruísmo, a Moral será introduzida para o bem da sociedade.

Resumindo a tese Socialista não Pacifista, podemos, já agora, exprimi-la da seguinte maneira:

"O capital Material, isto é, o patrimônio material da espécie, é obtido pelo trabalho multissecular contínuo de todos os homens; não é lícito que ele venha favorecer apenas um grupo reduzido de aproveitadores e oportunistas, pois este Capital, pertence a toda a Humanidade.

Dissemos que no inicio desta palestra que o Catolicismo, doutrina individualista por excelência, pouca atenção deu ao aspecto social do problema humano.

Mas, está tão em voga a mentalidade socialista, que a Igreja Católica Apostólica Romana, já vem nestes últimos séculos realizando esforços para a melhoria do Bem Estar Social do Homem na Terra, que começaram com as Encíclicas Papais: as primeiras foram, "Diuturnum"-(1831); "Mirarivos (1832)"; "Imortale Dei "-(1885); " Libertas "-(1888 )

Vale lembrar neste momento, que em 1848, um grupo de operários de Paris, fundou o Primeiro Sindicato do Mundo, chamado "Sociedade Positivista", chefiado pelo discípulo de Augusto Comte, o marceneiro Fabien Magnin.

Em 1864, tivemos o Papa PIO IX com as Syllabus, contidas na encíclica Quanta cura.

Dando precedência as questões sociais, a partir de 1891, alguns Papas realizaram profundas transformações, nos fundamentos intelectuais do catolicismo e, consequentemente em suas ações sociais, e foi com a encíclica RERUM NOVARUM (15/05/1891) que está comemorando 105 anos de publicação, que Leão XIII, iniciou este movimento progressista, com grande inspiração no Positivismo, pois a Igreja Católica, não podendo ligar-se nem ao socialismo, nem ao comunismo, por serem escolas revolucionárias, e portanto, contrárias a qualquer religiosidade, foi procurar respaldo nos ensinamentos de Augusto Comte, que faleceu em 1857 e nasceu em 1798, e criador da Religião da Humanidade, em 1855.

Logo após os horrores da Primeira Grande Guerra, da Revolução Russa Comunista, do Tratado de Versalhes é que sobressai - O Direito de Propriedade- Capital e Trabalho - Redenção dos Proletariados - O Justo Salário - Restauração da Ordem Social, onde podemos lembrar do Papa Pio XI, com a encíclica "Quadragésimo Ano "(15/05/31).

Não podemos nos esquecer das importantíssimas Encíclicas dos ilustres Papas mais recentes, abordando os temas Sociais:

Summi maeroris.............................Pio XII 1950

Summi pontificatus..........................Pio XII 1950

Pacem in terris................................João XXIII * 25 / 01/ 1963

Mater et magistra ........................João XXIII 15/ 05/ 1961 Populorum progressio....................Paulo VI 26/ 03 / 1967

Humanae vitae................................Paulo VI 1968

Octagesima adven...........................Paulo VI

Redemptor hominis.........................João Paulo II 15/03/1979

Laborem exercens..........................João Paulo II 14/ 09/1981

Dives in Misericordia......................João Paulo II 02/12/1981

Paz na Terra, Progresso do Povo e Exercício do Trabalho, temas que se ligam as diretrizes do Concílio Vaticano II - Papa João XXIII em 1959/1963.

(*) Este Papa foi grande amigo do Nosso Grande Positivista Paulo Carneiro - Diplomata e Membro Executivo da UNESCO, que o conheceu, quando este Papa ainda era o Cardeal Angelo Giuseppe Roncalli, em Paris, e representava o Vaticano.

Por tudo que acabamos de ver , é facil de concluir que o Socialismo , longe de ser uma Doutrina rígida, apresenta várias modalidades, conforme o grau de civilização ou as circunstancias históricas do meio onde se instala.

Entre os povos ocidentais, sobretudo em sua vanguarda, o Socialismo se manifesta por medidas tendentes a uma melhor incorporação do proletário na sociedade, e um maior ou menor controle do estado sobre a Indústria e a Economia. Exemplo o Trabalhismo Inglês.

Já na Alemanha de 1919, vencida e mutilada, desesperada, sedenta de vingança, o Socialismo tomou a feição nacionalista, reinvidicatória, enveredando pela economia dirigida e pelo materialismo racista, peculiar aos povos que se julgam superiores. A Alemanha – o herren-volk – seria o sol, em torno do qual gravitariam os outros povos . ( agora todos gravitam entorno do grupos dos 7 e principalmente dos USA, em outra forma de Doutrina).

Entretanto com a Rússia, dada a secular e brutal opressão, exercida pela nobreza egoísta, contra o proletariado, faminto e atrazado, a implantação do socialismo-comunista assumiu um aspecto extremamente sanguinário e violento.

Impropriamente chamado de comunismo – por que o Comunismo é impraticável – o regime Soviético, afastando a prometida ditadura do proletariado, caracteriza-se pela onipotência do Estado, ignorando o homem espiritual e moral, reconhecendo somente o homem econômico, autômato a girar a maquina estatal.

No terreno econômico adotou implacavelmente o conceito de materialismo histórico, que faz toda a evolução humana depender das necessidades mais grosseiras da espécie; a luta entre classes.

Para enfrentar com segurança essa falsa concepção do progresso é necessário pesquisar, com base na verdadeira ciência sociologia, as origens reais do capital e do trabalho.

Feita esta preliminar , sobre a formação do Capital e o advento do trabalho...., é chegado o momento de retomarmos o fio de nossa exposição inicial, que pode ser assim anunciada:

"O Positivismo é o traço de união entre o ponto de vista Moral do catolicismo e o ponto de vista Material das doutrinas Socialistas Modernas" Não Pacifistas.

Vamos mostrar , de agora em diante, como a Igreja Católica, teve sobretudo em mira a salvação da alma. Como já dissemos a existência terrena foi relegada a um plano muito secundário; sempre enaltecendo o sentimos de pureza (santos) e desprezando os sentimentos de Ternura; relegando a Mulher como causadora de todos os estragos da vira terrena. Fez o homem comer a maça do pecado. A ternura também faz parte do amalgama da sociabilidade.

Somente recentemente as relações sociais vem merecendo alguma atenção do Clero católico.

Por outro lado, ressaltamos, que o Socialismo que aí está, vem se preocupando exclusivamente com o fator econômico na evolução social, desdenhando, isto é, fazendo pouco caso das influencias cientifica de raciocinar, levando em conta as condições sociais provocadas pelos sentimentos morais, entre os seres humanos , quando de "passagem" aqui na Mãe Terra.

Vamos agora caracterizar rapidamente o papel do Positivismo.

Pouco antes do nascimento de Augusto Comte, José De Maistre (1754–1821), o grande pensador católico, assim vaticinava em sua obra Soirées de Saint-Petesbourg:

"Estou tão persuadido das verdades que defendo que, quando considero o enfraquecimento geral dos princípios morais, a divergência das opiniões, o abalo das soberanias baldas de base, a imensidade de nossas necessidades e a inanidade de nossos meios, parece-me que todo verdadeiro filósofo deve optar por uma destas hipóteses: ou vai se formar uma nova religião, ou o Cristianismo será rejuvenescido por algum meio extraordinário. É entre estas duas suposições que é preciso escolher, segundo o partido que se tiver tomado sobre a verdade do Cristianismo.

Esta conjetura só será repelida desdenhosamente por esses homens de vista curta, que só acreditam no que estão vendo.

Que homem da antigüidade teria podido prever o Cristianismo?

E que homem estranho a esta religião teria podido, nos seus começos, prever-lhe o sucesso?

Como saberemos que uma grande revolução moral não está já iniciada ?

Aguardai que a afinidade entre a ciência e a religião as reuna na cabeça de um só homem de gênio; o aparecimento deste homem não poderá estar longe, talvez mesmo já exista: ele será famoso e colocará fim ao século dezoito que continua a durar. ( quando José de Maistre faleceu, Augusto Comte tinha 32 anos)

Chegamos à maior das épocas religiosas, na qual todo homem, se para isso tem forças, é obrigado a trazer uma pedra para o edifício augusto cujos planos estão visivelmente delineados".

 

Essas memoráveis palavras do eminente De Maistre, além de refletirem magistralmente uma situação moral e social, encerram exata antevisão histórica.

De fato, pouco depois, em 19 de janeiro de 1798, nascia Augusto Comte.

Herdando de sua mãe, Rosalia Boyer, profunda católica, o apego aos ideais religiosos, mas também, graças a uma cerebração portentosa, impregnada de todas as solicitações da fé científica, ele mostrou, desde logo, ser a natureza predestinada que o pensador católico profetizara.

Com pouco mais de vinte anos enuncia a sentença magistral que institui a verdadeira teoria da relatividade:

"Tudo é relativo, eis o único princípio absoluto".

São também dessa época seus trabalhos sobre Filosofia Social, onde se manifestam nitidamente as preocupações do jovem pensador com a reorganização espiritual da sociedade.

Pouco depois funda a Sociologia Positiva descobrindo seu princípio fundamental.

Percebeu desde logo que a crise era sobretudo mental e que o Catolicismo perdera gradualmente aquela indiscutível autoridade que fora seu apanágio na Idade Média.

Sentiu Augusto Comte que as crenças sobrenaturais enfraqueciam-se e perdiam prestígio. Viu mais que só as afirmações com base científica mereciam completo crédito. Em outras palavras:

"a ciência é a única fé suscetível de se tornar universal".

Resolveu então realizar um balanço completo de toda a ciência, desde a matemática até a sociologia, escoimando-a, isto é, se livrando de quaisquer considerações de ordem teológica ou metafísica.

E assim construiu o alicerce de sua doutrina, isto é, a Filosofia Positiva.

Compenetrado de que o homem é um ser de extrema complexidade e que, para regular a conduta humana, não só individual como coletiva, era preciso atender a todos os setores desse complexo, concluiu que a solução para todas as modalidades do eterno problema humano seria construir, com base na experiência do passado, um sistema capaz de estabelecer a unidade, o equilíbrio individual e religar todas as individualidades. Em suma, fundar uma nova religião ou doutrina.

Muitos estranham o qualificativo religião atribuído ao Positivismo. Sob o ponto de vista etimológico, religião vem de religar. Assim, portanto, "religião não é somente uma doutrina baseada em crenças sobrenaturais. . . mas um sistema de sentimentos, convicções e atos, capaz de assegurar, simultaneamente, a regulamentação da vida individual e o congraçamento de todos os indivíduos em torno de um supremo ideal".

No Positivismo esse ideal é a Humanidade.

Consagra, portanto, o Positivismo todas as elevadas aspirações morais do Catolicismo, estabelecendo como alvo supremo da religião a vitória do altruísmo sobre o egoísmo.

Tudo isso, porém, sem artifícios divinos, nem ameaças infernais, mas por meras considerações humanas e terrenas, pois encara a felicidade como decorrente do digno cumprimento do dever.

Conforme dizia Clotilde de Vaux, a extraordinária inspiradora e colega de Augusto Comte:

"Não há prazeres que possam exceder os da dedicação".

Não glorifica, portanto, os "pobres de espirito" (pobres de inteligência) , mas estimula os "ricos de coração"(de bons sentimentos).

Considera a inteligência um instrumento admirável quando à serviço do bem. Como dizia Pitágoras em seus versos áureos:

"Aos deuses apraz que menos sofra aquele que, por bem meditar, mais e mais longe enxerga".. . e Augusto Comte, reforçou "Saber para prever a fim de prover "

Todavia tem sempre presente o conselho de Tomás de Kempis (1380-1471) :

Omnis ratio ei naturalis investigatio lidem sequi debet, non praecedere, nec in fringere.

Concede um pleno surto à atividade, dignificando e enaltecendo o trabalho como um meio seguro de aperfeiçoamento moral. Define a indústria como sendo "a ação real e útil do homem sobre o planeta", ou o esforço contínuo do homem para tornar a Terra cada vez mais propícia à Humanidade.

No que diz respeito à estruturação social podemos considerar o Positivismo como concebendo a coletividade com uma feição inteiramente funcional.

A grande massa humana tem que ser proletária. Dela são destacados dois pequenos grupos de escol :

os chefes práticos destinados a gerir o capital humano e os orientadores teóricos votados ao sacerdócio, isto é, à direção espiritual da sociedade, e

a imensa legião feminina ou proletária agregada à elite patrícial e sacerdotal; só terá uma destinação: aliás dupla, criar e educar.

 

 

"O capital é social em sua origem e deve ter destino social", diz Augusto Comte. E o melhor meio de conservar e desenvolver o capital consiste em entregá-lo à homens capazes, dotados de ardor social.

Nas mãos do Estado, o capital perde a força por falta do necessário estímulo que dá à apropriação da riqueza.

O respeito à liberdade é fundamental na doutrina de Augusto Comte: liberdade de manifestação do pensamento, liberdade de associação e reunião, liberdade de ensino, liberdade profissional, liberdade de religião; "Liberdade" - diz o filósofo - "toma-se, não se pede".

Muito teríamos a dizer sobre a feição social, que o Positivismo imprime à indústria, ao salário, aos lucros etc. Igualmente tencionávamos mostrar como em uma sociedade, verdadeiramente funcional, a burguesia tende a desaparecer.

 

Mas já vai longe a nossa palestra.

 

É preciso, porém, salientar que, segundo Augusto Comte, "a incorporação do proletariado na sociedade é o principal problema social contemporâneo".

Mas isso, tem que ser feito fraternalmente, sem provocar agitações, sem atiçar revoltas, sem despertar rancores, sem explorar desesperos.

É mister, ainda, deixar bem claro que a Doutrina da Humanidade consagra o ponto de vista social tanto em seu culto sociolátrico, como em seu dogma logosócio, como também em seu regimen sociocrático.

Por tudo o que acabamos de expor podemos concluir que o Positivismo, além de consolidar e aperfeiçoar o destino eminentemente moralizador da religião, estende seu domínio aos setores intelectual e prático. Institui, portanto, uma doutrina religiosa, social e terrena.

Por outro lado encara o pensamento socialista como sumamente honroso, e oportuno, mas parcial e incompleto, podendo, por isso, cometer erros gravíssimos.

Efetivamente foi, de início, o aguilhão da fome e do medo que levou o homem aos primeiros grandes progressos. Não fosse ele, porém, dotado de inteligência e de altruísmo, seria hoje mais uma espécie animal a vagar pela terra, incapaz de formar qualquer sociedade.

Portanto o Positivismo, aceita o Socialismo quando se eleva do grosseiro materialismo para alcançar um alto nível intelectual e, sobretudo, moral.

Pois não deixamos de ser um Socialismo Pacifista

Assim, a Doutrina da Humanidade, fundada por Augusto Comte, sob a alta inspiração e o inestimável concurso de Clotilde de Vaux, pode ser considerada como o verdadeiro traço de união entre o Socialismo materialista e o Catolicismo moralizador.

Era o que pretendíamos demonstrar.

 

 

PS. As palavras e as frases em negrito-inclinadas, foram introduzidas por P. A . Lacaz, em 210 ou 1999. www.doutrinapositivsta.hpg.com.br www.multimania.com/clotilde/urls.htm